10 October 2010

A experiência do animal (becoming animal)

Vou tentar explicar a experiência do homem/animal. Experimenta fazer isto com alguém que conheças muito bem, o teu parceiro por exemplo.

Passo 1: começa por olhar nos olhos dessa pessoa. Ali esta’ alguém que conheces muito bem, uma cara familiar, um sentimento de conforto provavelmente ate’.

Passo 2: deves agora fixar-te nos olhos dessa pessoa, aprender os detalhes do olhos, se a cor e’ uniforme, se muda do interior para o exterior, se o lado direito do olho esquerdo e’ mais riscado que o lado esquerdo do olho direito, ou outra coisa qualquer que ve’s todos os dias, mas nunca viste.

Nota 1: aqui falo so’ disso mesmo, ver o que vemos mas não vemos. Ver aquilo que esta la’ mas não vemos, que nos dará acesso, mais tarde, a outras realidades. Porque “realidade”, todos dizem, e’ isso que todos vemos. Mas se todos não vemos tudo aquilo que vemos, que realidade e’ esta? O exercício leva-nos para ale’m desta realidade. Para outra, uma qualquer! O exercício e’ portanto um exemplo.

Nota 2: se não tiveres parceiro ou quiseres ter resultados mais interessantes, faz o exercício ao espelho. Não acredito que conheças todos os detalhes dos teus próprios olhos, como quem conhece todos os detalhes da sua própria mão, ou do seu nariz. Pode ser perigoso! (Pirandello)

Passo 3: depois de te teres perdido nos detalhes dos olhos que estão a’ tua frente, foca-te num so’ olho, repara como abre e fecha, concentra-te nas pestanas e depois nas mucosas laterais e naquela membrana que segura os olhos la’ dentro. Depois olha a pele interior que se ve’ a tocar no olho logo ao lado das pestanas.

Passo 4: depois de alguns minutos de círculos de atenção, aos poucos, vais começar a ver aquele olho, talvez outro olhoO risco a traçar vai da cara da pessoa que conheces ate’ ao olho que e’ igual ao de um lagarto. Aos poucos aquele olho passa a ser animal. Passa a ser uma coisa estranha, viscosa.

Passo 5: depois de o olho se ter tornado estranho podes desfocar, podes voltar ao todo, podes concentrar-te na cara, no pescoço, no corpo. Nas suas rugosidades ou plasticidades. O objectivo e’ no final olhares a pessoa com quem te sentias confortável e sentires um animal estranho a’ tua frente, as pálpebras para cima e para baixo, os lábios de carne molhados, a pela da cara a esticar e contrair-se: eu amo um lagarto!

Passo 6: quando este lagarto começar a falar outra vez contigo (ate’ aqui a experiência tem de ser feita em silencio), a sensação atinge o seu auge se não entenderes o que diz. Portanto, se ele ou ela fizer alguma coisa que tu não entendas melhor: estás perante um animal estranho.

Passo 7: aos poucos voltaras atrás, a pessoa passara’ a ser a normal que sempre conheceste e te faz sentir confortável. A viagem terminou.

Nota 3: o mundo podia ser todo aquele em que viste este animal. Essa pessoa próxima vista como um animal. Agora imagina que esse mundo que viste, animal, e’ o real. Ou talvez seja so’ outro possível, outro simulacro.

No comments: