12 October 2010

Manatee Tail

Today I dreamed I was swimming with a manatee and that I was obsessed with the beauty of its tail.

A dream is memory. The tail of the manatee I saw in Belize in August was the most beautiful thing I saw in this trip, maybe in my life.

The manatee is also known as the sea cow, it is a mammal that can stay underwater for 15 minutes. 

Watching that animal swimming away from me into the dark ocean was a dream like vision. Slowly moving its perfectly round tail up and down. I remember its loneliness, the dark blue of the ocean, the silence, but specially, the incredible shape of its tale (similar to the tale in the picture above but even better).

10 October 2010

A experiência do animal (becoming animal)

Vou tentar explicar a experiência do homem/animal. Experimenta fazer isto com alguém que conheças muito bem, o teu parceiro por exemplo.

Passo 1: começa por olhar nos olhos dessa pessoa. Ali esta’ alguém que conheces muito bem, uma cara familiar, um sentimento de conforto provavelmente ate’.

Passo 2: deves agora fixar-te nos olhos dessa pessoa, aprender os detalhes do olhos, se a cor e’ uniforme, se muda do interior para o exterior, se o lado direito do olho esquerdo e’ mais riscado que o lado esquerdo do olho direito, ou outra coisa qualquer que ve’s todos os dias, mas nunca viste.

Nota 1: aqui falo so’ disso mesmo, ver o que vemos mas não vemos. Ver aquilo que esta la’ mas não vemos, que nos dará acesso, mais tarde, a outras realidades. Porque “realidade”, todos dizem, e’ isso que todos vemos. Mas se todos não vemos tudo aquilo que vemos, que realidade e’ esta? O exercício leva-nos para ale’m desta realidade. Para outra, uma qualquer! O exercício e’ portanto um exemplo.

Nota 2: se não tiveres parceiro ou quiseres ter resultados mais interessantes, faz o exercício ao espelho. Não acredito que conheças todos os detalhes dos teus próprios olhos, como quem conhece todos os detalhes da sua própria mão, ou do seu nariz. Pode ser perigoso! (Pirandello)

Passo 3: depois de te teres perdido nos detalhes dos olhos que estão a’ tua frente, foca-te num so’ olho, repara como abre e fecha, concentra-te nas pestanas e depois nas mucosas laterais e naquela membrana que segura os olhos la’ dentro. Depois olha a pele interior que se ve’ a tocar no olho logo ao lado das pestanas.

Passo 4: depois de alguns minutos de círculos de atenção, aos poucos, vais começar a ver aquele olho, talvez outro olhoO risco a traçar vai da cara da pessoa que conheces ate’ ao olho que e’ igual ao de um lagarto. Aos poucos aquele olho passa a ser animal. Passa a ser uma coisa estranha, viscosa.

Passo 5: depois de o olho se ter tornado estranho podes desfocar, podes voltar ao todo, podes concentrar-te na cara, no pescoço, no corpo. Nas suas rugosidades ou plasticidades. O objectivo e’ no final olhares a pessoa com quem te sentias confortável e sentires um animal estranho a’ tua frente, as pálpebras para cima e para baixo, os lábios de carne molhados, a pela da cara a esticar e contrair-se: eu amo um lagarto!

Passo 6: quando este lagarto começar a falar outra vez contigo (ate’ aqui a experiência tem de ser feita em silencio), a sensação atinge o seu auge se não entenderes o que diz. Portanto, se ele ou ela fizer alguma coisa que tu não entendas melhor: estás perante um animal estranho.

Passo 7: aos poucos voltaras atrás, a pessoa passara’ a ser a normal que sempre conheceste e te faz sentir confortável. A viagem terminou.

Nota 3: o mundo podia ser todo aquele em que viste este animal. Essa pessoa próxima vista como um animal. Agora imagina que esse mundo que viste, animal, e’ o real. Ou talvez seja so’ outro possível, outro simulacro.

O autocarro da noite

(continuação, mais pobre, do acreditar na noite, escrito numa outra insonia na noite chinesa, um tema e pergunta fundamental desta viagem: que trazemos no's da noite? que leva'mos no's deste dia para a noite? na noite nada permanece: se nao permaneco, que sou eu senao esse nao permanecer?)


O autocarro da noite entra pela noite dentro. Entra-se no autocarro ao final da tarde. Sai-se do autocarro pela manha da vida. A saída e’ de um mundo, a entrada noutro, e pelo meio, a viagem de autocarro.

A viagem de autocarro e’ uma viagem pelo vazio, pelo caos. Na china, entra-se num ponto desconhecido e, na china, sai-se noutro desconhecido.

Durante a viagem pela noite o autocarro passa territórios escuros e abana. As convicções não ficam. Durante a noite há o medo, há a desconfiança e deve-se estar preparado para morrer. Como na insónia e no acreditar na noite. E' mesmo preciso acreditar na noite!

De manha o mundo começa outra vez e temos de nos refazer de tudo. Como quem começa de novo. Pela noite dentro que levamos no's da noite? Que trazemos no's da noite? Que fazemos no's da noite? Que leva'mos no's deste dia para a noite? O autocarro da noite abana, convicções e não deixa dormir. Tens de estar preparado!

06 October 2010

O “rapaz porquê” cresceu e, continuando a perguntar, deixou de querer respostas

Ao entrar no avião de Londres para o Porto, a sua voz de dez anos é a minha voz de 10 anos. O sotaque de 10 anos é muito forte. E pergunta coisas, claro. Ele quer descobrir, perguntar. A mãe não lhe diz. Mas ele não desiste de perguntar. O que é? Como é? Ele esteve em Londres uns dias. Ele vai voltar para o Porto onde as perguntas são mais difíceis. Onde há menos perguntas para perguntar? Em casa. Ele tem 10 anos, eu também. E também volto para casa, onde há menos perguntas perguntáveis. Onde a diferença se deita e descansa.

E quando ele pergunta, ele sorri pois, e salta até. Saltar de pedra em pedra na praia ou montanha enquanto faz perguntas sem parar. Sem querer sequer as respostas. Só um “Mãe, os aviões têm filhos?” qualquer. Que vai ser dele quando já não tiver 10 anos? Porque vamos parar os dois de crescer aos 10 anos? Aos 10 anos, e’ bom, e nem eu nem ele queremos voltar, como quem tem uma mãe sempre a’ mão. O avião arranca para o Porto, alguém atrás de mim troca um V por um B e eu envelheço. O imediatamente antes de chegar e’ o momento mais triste da viagem.

Impressões da primeira meia hora em New York

E’ sempre maravilhoso chegar a uma grande cidade do mundo. Antes Tokyo, agora New York. Algo em comum, uma chegada tarde e sem plano algum. Sem mapas. Sem ideias. So’ uma cidade gigante e muito imaginário. No avião já se ouve o sotaque nova-iorquino cheio de energia a falar dos seus produtos e negócios. A’ saída logo um senhor de 70 anos de smoking impecável, pronto para entrar numa festa de gala ou limousine.

No comboio aéreo entre terminais passo no parque de estacionamento e vejo limousines a perder de conta. Começo a cantarolar “New York, New York”. E as memórias começam a aparecer. O livro This Side of Paradise (Fitzgerald) vai ajudar. A Nova Iorque vem-se de smoking! Times Square/Central Park, não e’?  A estátua da liberdade, o empire state building e as twin towers. Nada disso: New York e’ o MOMA e o MET! E que mais! O comboio das 23h entra pela cidade a dentro e as referências multiplicam-se com a inspiração: aqueles bonés NY aqui são locais.

E’ a capital? Não. E’ a maior do mundo? Não. E’ provavelmente a mais rica cidade do mundo? Arriscaria que e’ a cidade com mais milionários. Não são um ou dois shakes que são pentamilionarios. Não, e’ uma cidade de milionários, Nova Iorque tem milhares de milionários!

02 October 2010

Funeral oration for a passport (me, my body, and my identities)

Dear (not so) old passport, I never really liked you.
They look at you
and call me Ramos
They stamp your pages
and let me pass…

Borders they say! They have big pieces of cloth they call flags and they say they are proud of. They are proud of being born in a specific piece of land and not another. They call these places countries. They call me “Portuguese!” because I was born in a place and not another.

When I was born, they wrote Ramos on you to keep track of my body. They call it a legal identity: I am you and I am my body. And Ramos they call to all these things.

They do the same to themselves! They make signs in papers to make believe the papers represent their bodies. They even believe their bodies represent themselves!

But after those so many borders and papers and stamps, my dear, I see just more men. All the same eyes, mouth and feet, and all with the same gaze, looking for food and shelter.

Sometime in the future they will call Ramos to the court, you, my body and me. But well, I like to use you to travel, and pretend I am that Portuguese Ramos they say I am. You and me together! But when they call this Ramos, my dear, I will refuse, I will tell them the truth about you and I. I will tell them I am no Ramos. I am not the entity they say you represent. I am no paper or classification. I am no you!

I may accept I am this body today, but I will never accept that I am you. I will always refuse to understand the reason of your existence.

My dear passport, I hope you rest in peace!