27 December 2010

No depois, restam-nos palavras

A viagem não e’ este blog, digo para mim acusando-me de o pretender sempre que aqui venho. Um texto e’ só um texto. As palavras não são as coisas, são outras coisas. Mas agora que já’ não viajo restam-me apenas palavras. No depois, restam-nos palavras? Só elas são apalpáveis. Como se atiram memorias despalavradas contra uma parede? Felizmente o mundo não e’ uma parede de palavras (sempre viscosamente) agarradas nas paredes… um blog.
Seguem algumas entradas sobre temas que, como exemplo do que acabo de escrever, quase não passaram neste blog mas que habitaram permanentemente esta viagem: comida, arqueologia e arte.

Art, from memories to fantasies

There was this little wooden house by the turquoise blue water of the Mediterranean sea. A big green tree burst from the ground and invaded the clean sky scratched by orange mountain tops. The sun caressed my wet skin as I got out of the water. The sand on my feet and the warm wind made me bliss and I decided to go inside. As I opened the door of that small abandoned house the sun invaded an enourmous one division house with nothing inside except a few frames on the wall, some paintings... a dozen works of art I had bought some years before. I remember the light crossing from the door to the Song of the Lark (left) standing in the corner and the shadow dividing the Lorrain (right) in a diagonal. There I was, at home. Art as home.







But let's destroy this clean image of art. As an educated man I developed this sense of art, a taught taste that gives me pleasure. Mozart, Rimbaud and Pousao (portuguese painter), random young men, authors of objects that give me pleasure. No utility, no purpose, no meaning in the works themselves. Men producing objects of pleasure for other men to use.

I think I have more than 2 years "on the road" now (I started blogging a bit late, 2007, while the road started, if a point is needed, on March 11st 2002, Porto-Nice). Six month of life on the road is equivalent to 10 years of life in the office or lab. With such a long road driven, I feel I have memories the same size as an 80 years old man, and as an old man, there's not much difference between very old real memories and very recent fantasies.

22 December 2010

o mundo museu e a arte espelho

Os museus são uma parte fundamental das minhas viagens. Visitei dezenas de museus de arte nos últimos anos de viagem. Raramente escrevo sobre eles. Gostava de ter o tempo e paciência para escrever sobre os museus e seus detalhes. Escreveria sobre “artistas locais” como Guayasamin no Quito, Magritte em Bruxelas, Wu Guanzhong em Hong Kong, Botero em Bogota, Pollock em Nova Iorque, Guo Xi em Xangai, Van Gogh em Amesterdão, Albright em Chicago, Turner em Londres, Orozco na Cidade do México, Goya em Madrid, Schiele em Viena e Picasso em todo o lado (Nicarágua, Colômbia, Brasil, China, Japão, US e … Espanha).

Caminho pelas salas do MET em Nova Iorque e apercebo-me que não há ali nada, só objectos insignificantes pendurados nas paredes. As cores poderiam bem ser riscos de parede usada. Como, na rua, uma barra de Mars e apercebo-me que ali não há nada, só objectos, como um morango que colho e ponho na boca. Ou então, ali, em cada coisa, há tudo dentro de mim. Tudo ecoa dentro de mim. Ir a um museu não e’ ver as obras, e’ antes visitar aquilo que aqueles riscos e cores despertam dentro. As minhas memórias, referencias e ideias.

Em viagem, não necessito de um museu, basta-me um objecto qualquer para despertar as ideias. Em viagem tudo e’ museu. E’ que há esta característica do viajante, ele e’ o grande observador, como se o mundo não lhe tocasse. O viajante tem esse grande poder de não ser afectado pelas coisas que vê, que observa. Um mundo museu!

E deixo aqui um pouco de “arte” feita por mim. Na praia paraíso de Tulum no México, de madrugada moldo a areia e faço um auto-retrato com a luz do luar (a ultima foto foi tirada na manha seguinte). Que mais pode a arte ser senão um espelho? E e' exactamente esta característica que me afasta fundamentalmente da arte. O artista tem só um nome: Narciso.

auto-retrato em (linha de) fuga para cara de escama de peixe com cancro


17 December 2010

Comida

Depois de uns shish kebabs no Egipto (espetada de borrego) acompanhado com o maravilhoso pão egípcio e do mezze na Jordânia, veio o conflito entre árabes e judeus. A escolha gastronómica entre judeus e árabes e’ muito mais difícil que a escolha politica. O húmus de Jerusalém e’ magistral (cheio de azeite de óptima qualidade), o húmus em Aleppo vem acompanhado com um pão de pimenta quente inesquecível. O falafel em Damascus custa menos 10 vezes que em TelAviv mas não fica atrás em nada! Os standards Turcos passaram com gozlemes, durums e afins mas o que ficou da Turquia foi o gosto do chá de maca durante as noites de shisha.

No Laos come-se sopa de noodles ou arroz pegajoso (foto em baixo a' esquerda). O sabor convence sempre porque Laos rima com cebolinho! A China e’ um mundo e a sua comida também com mil variedades de dumplings, noodles, arrozes, agridoces e hot pots. No final lembro-me dos cogumelos exóticos a ferver no hot pot e dos noodles e dumplings de legumes feitos no momento algures no meio da montanha (foto em baixo a' direita). Em Macau, a sopa de vaca e ostras rivalizou com o omnipresente conguee em Hong Kong (sopa branca na foto a' esquerda) acompanhada por uns grelos com molho doce divinais).




 

Para não me alongar muito deixo só mais duas entradas que estão bem no topo dos meus pratos favoritos (só o Ceviche Peruano e’ indestronável). No Japão, arroz branco com ovos crus/escalfados com umas tiras de carne grelhada por cima (isto para não falar do okonomiyaki, a pizza japonesa). No México, tacos chori-queso: tacos com chouriço em queijo derretido com cebola e guacamole, o melhor prato do mundo!
Que fome!


E como a expressao "o melhor prato do mundo" me leva para mil lugares diferentes, deixo mais um, a Sopa Marinera caseira de Sambo Creek, nas Honduras (a' direita).


Honduras? E pequenos almocos? Quesadillas de feijao, queijo de cabra e ovo? Vamos la'?


13 December 2010

Da arqueologia a’ filosofia

A arqueologia e’ a maior das ciências, e’ a historia que não esta’ escrita, história sem letras. Na arqueologia não e’ o artefacto que interessa, e’ o que o artefacto revela. O para alem do que se sabe, para alem do que se pode saber. E’ a verdadeira ciência do desconhecido. O que fascina o verdadeiro arqueólogo, que não e’ ladrão, não e’ o objecto lindo de ouro, e’ a aura desse objecto, o que havia em volta, o contexto inconcreto de cada artefacto, inalcançável, o impossível desenhar: linha de fuga que parte do objecto encontrado.  A arqueologia, tal como um museu, não tem o que interessa (a realidade aparente que vende), pelo contrário, tem de ser imaginada. Todos os museus são sobre aquilo que não esta' lá, sobre o que não vai ficar. O para alem da “realidade” aparente.

E’ preciso arqueologizar, não só o saber com Foucault, mas a própria vida-mundo. Buscar o que esta’ em volta daquilo que nos e’ dado, admitindo desde logo a impossibilidade do concreto. Não há concretos! Não há realidade palpável, só nos resta a arqueologia.

E e' por isto que o meu monumento favorito em todo o mundo são as ruínas de Chan Chan no Peru. E’ um castelo de lama com mais de 1000 anos que parece vulnerável a uma simples rajada de vento. Facto que nos faz lembrar as coisas que não foram preservadas, “levadas pelo vento”. Pelo contrário, as pirâmides do Egipto, que eu desgosto particularmente, são grandes e famosas porque ficaram, porque há provas da civilização. O que queremos aqui e’ aquilo que não ficou! A maior civilização antiga e’ a que não ficou para ver. E Chan Chan e’ a minha favorita porque quase não ficou, como um bastião do inalcançável.

E da arqueologia, ciência do Proibido Permanecer, para a Filosofia.  Filosofia e’ só o conjunto de actividades a que nos entregamos com o objectivo de alterar a nossa própria forma de pensar. E diz-se própria no sentido em que alterar uma forma de pensar e’ alterar uma forma de ser. O culto daquilo que não permanece foge do culto do que permanece. Foge da febre do arquivo, do coleccionismo analista. O culto do que permanece (incluindo na arqueologia, quando se ignora, não se vendo, o que não se vê) leva-nos a um estado estático. Por exemplo, a incapacidade de filosofar, modo de pensar aquilo que sempre pensamos no passado (o grande domínio do superego).

E ao deixar o blog do Proibido Permanecer deixo a sua ética explicada: a vida deve ser o que não permanece. A vida e' muito mais do que as coisas que temos e vemos e memorizamos. A vida e' principalmente aquilo que não tocamos, o que nos passou por perto, aquela bruma de possibilidades que nos atravessam. O que fica e' um detalhe. O que podia ficar e' o grandioso. Nós, o cérebro, não somos feitos para o que aconteceu ou acontecera’. Nos somos feitos do que poderia ter acontecido para o que poderá acontecer.

02 December 2010

Alguns dos livros desta viagem

Foi uma viagem lancada por 3 gigantes:
Foucault, Hermeneutics of the Subject
Bergson, Matter and Memory
Deleuze, Diferença e Repeticao

E mais alguns:
Foucault, Security, Territory and Population
Lyotard, Postmodern Condition
James Joyce, Dubliners
Solsestinin, One day o the life of sergei ivanovitch
Faulkner, O som e a furia
La Celestina