23 February 2010

the Vanishing Line

Uma nova viagem. Não há plano. Há uma mochila às costas com livros lá dentro e um pé à frente do outro.


Depois de recuperar a paz perdida, que presumo será fácil, o que quero desta viagem? Viajar e viver são dois verbos que permuto continuamente. O que quero desta vida? E aqui pergunto-me porque está a pergunta "Quanto tempo?" dentro de toda a gente?
Não sei quanto tempo vou viver ou como vou viver. Sei aquilo que se mostra perante mim em cada evento. Derivo éticas a cada esquina. "There is no answer, there is no question, thus, there are no ethics".

Para viajar/viver não é preciso mudar de local, basta viver/viajar por dentro.
É possível viajar sem sair do sítio. É possível experimentar o que o drogado sente sem tomar drogas.
Os verdadeiros nómadas não se deslocam. O mundo à sua volta é quem se desloca.
Mas para isso é preciso ultrapassar o problema da diferença indetectável. No território conquistado e repetido, em casa, a diferença torna-se indiscernível. Noutro ambiente, em viagem, a diferença é tão grande que não é necessário esforço para reparar na diferença. Com a viagem, aumentam as diferenças. É preciso portanto viajar fisicamente. Apanhar o comboio é aumentar o potencial de detecção de diferenças.

A viagem começa onde acaba a diferença entre eu e o outro, entre o nós e o eles. A viagem começa na desfragmentação do eu, na sua integração com o outro, no ver pelos olhos dos outros, na experimentação do "Ser o Outro". Não é tédio mas é intermédio entre mim e o outro. Ser drogado sem droga, "ser sem ser, become". O viajar começa onde acaba o ser e começa o devir (o become). Devir oriental (arab), ou qualquer outra coisa. Esta é a linha de fuga entre o eu e o outro. Uma linha de voo claro. Uma linha de integração do "eu muçulmano, tu ocidental".

"A desterritorialização e a reterritorialização cruzam-se no duplo devir. Não se consegue já distinguir o autóctone do estrangeiro, porque o estrangeiro se torna autóctone na terra do outro que não o é, ao mesmo tempo que o autóctone se torna estrangeiro, em relação a si próprio...", Deleuze
prazer da casa não está em estar em casa, está no chegar a casa, no voltar. Para isso é preciso sair. É preciso traçar linhas de fuga e depois voltar. As linhas de fuga a desterritorializar; desterritorializações que não existem sem reterritorializações, voltas a casa, mas principalmente, voltas a novas casas, ou então, voltas à mesma casa que já não é a primeira casa.

Até já.
Ah, 1 de Março, cidade do Cairo. Não sei quanto tempo. Aviões evitam-se. Egipto à Turquia. Kyrgyzstan até Beijing. Japão aos States. Ou se calhar volto para a semana. Ou se calhar o contrário. Ou tudo o que tu quiseres.

2 comments:

O Coxo said...

Que queres que te diga: invejo-te. É possível viajar sem sair do sítio ? sim, mas esse é um privilégio dos que vivem debruçados para o interior (o interior como voragem). Infellizmente não sou eu: eu sou um consumidor do imediato, vivo da voracidade das sensações tangentes. Sou uma espécie de junkie da diferença, segundo a tua descrição, e a metadona só está a retardar o inevitável. Por isso faz-me um favor: de vez em quando escreve qualquer coisinha que me permita, digamos assim, vir à tona respirar. Boas viagens.

O Coxo said...

já agora:
http://cantodocoxo.blogspot.com/2010/02/mares.html